Começo com este texto uma série de pequenas reflexões no campo da Filosofia do Direito, em conformidade com o plano da cadeira de Filosofia do Direito em vigor na Faculdade de Direito da Universidade Eduardo Mondlane.
Um jurista estudar filosofia? Para quê? Porquê?
Na verdade, fora dos específicos cursos de filosofia leccionados em algumas faculdades de ciências humanas, a filosofia sempre tem a necessidade de se justificar quando é integrada nos curricula académicos.
Frequentemente tida como enfadonha, como gosto pela especulação inútil e associada à vaga lucubração, a filosofia é, porém, a área do saber - se é que assim podemos chamar - que mais mutações sofre no que respeita ao seu conteúdo, o que sucede como consequência da sua vocação para a reflexão sobre a universalidade do real, universalidade essa que não pára de mudar ao longo dos tempos. É o tal eterno devir de que tanto se fala desde os naturalistas de Mileto.
G. Leibniz, um destacado filósofo da Idade Moderna, reflectindo sobre a importância da filosofia na formação do jurista suspirou num dos seus escritos: «como seria bom que os juristas renunciassem ao seu desprezo pela Filosofia e compreendessem que, sem ela, a maior parte dos seus problemas são labirintos sem saída!». Um pouco mais tarde, Franz Brentano veio a dizer que «a nossa vida política, com os seus inúmeros defeitos, só poderá melhorar quando os juristas passarem a ter uma formação filosófica consentânea com a sua alta missão».
Entretanto, à partida, os filósofos são pessoas suspeitas para falar da importância do estudo da filosofia na formação dos juristas, pelo que deveremos deixar a ciência falar por si!
Originada do espanto (Platão) ou da admiração (Aristóteles), a Filosofia é uma ciência essencialmente indagativa (aqui tomando o termo ciência no seu sentido amplo, como um conjunto de conhecimentos sistematicamente encadeados e obtidos com base num método determinado, no caso, o método da análise crítica e da justificação lógico-racional).
A constante capacidade do Homem de se admirar e espantar diante da realidade e, por consequência, de se interrogar acerca da mesma, é o factor que se encontra na base da filosofia, uma ciência que se fundamenta basicamente na reflexão e não na mera descrição da realidade como ocorre com outras áreas do saber.
Nessa sede, é entendimento assente que a filosofia não se aprende nem se ensina. A Filosofia não centra o seu enfoque no amontoado de conhecimentos que se vão dando como certos ao longo da História, antes pelo contrário, ela é essencialmente vocacionada a pôr em crise todos os pensamentos assentes, numa marcha indagativa que aspira sempre chegar à causa última da realidade. Aliás, reflexão vem do latim «reflectere» que significa, precisamente, «voltar para trás».
Entretanto, não é sobre a Filosofia em si que esta série pretende tratar e sim da Filosofia do Direito, isto é, da reflexão filosófica tendo por objecto a realidade jurídica.
A expressão «Filosofia do Direito» é relativamente nova, tendo tido as suas primeiras e mais difundidas utilizações no século XIX, com as obras de Hegel, Lerminier, Austin, Ahrens e Rosmini e, no Direito português, com Ferrer Neto Paiva e António Luís Seabra.
Como cadeira do curso de Direito no ensino público em Moçambique, a Filosofia do Direito foi introduzida com a reforma curricular empreendida na Faculdade de Direito da Universidade Eduardo Mondlane que entrou em vigor no ano de 2004, sendo, entretanto, que a primeira turma a receber as lições de Filosofia do Direito só as teve no ano de 2006, no terceiro ano do curso, sob a regência do Mestre Henriques J. Henriques.
Antes desta revisão, era leccionada naquela Universidade a cadeira de Filosofia geral, que podemos aqui tomar como género da espécie Filosofia do Direito. Com efeito, a Filosofia do Direito é uma parte da Filosofia, é reflexão filosófica sobre o Direito, ou, consideração do Direito sob ponto de vista filosófico.
Colocar o Direito sob o crivo da indagação filosófica, questionando o ser e o valor do Direito, reflectindo sobre a opção da humanidade pela ordem em detrimento do caos, investigando as diversas percepções sobre o homem que estiveram na base da ideia do Direito ao longo da História da Humanidade (etc.) é a missão da Filosofia do Direito.
Com a série que ora se inicia, espero ajudar os meus estudantes em especial e os amantes da Filosofia do Direito em geral a trilharem com luzes mais cintilantes o interessante mundo da reflexão filosófica sobre o Direito.
No próximo texto, trarei uma reflexão sobre as características da filosofia.
um abraço a todos
Nota: este pequeno texto contém referências retiradas da obra Filosofia do Direito do Prof. António Braz Teixeira
1 comentário:
Saudações!
Gostaria de ter um esclarecimento acerca da indemnização por danos não patrimoniais emergentes da relação laboral...
Será que ha lugar para indemnização desta natureza no nosso O.J?
Quid juris à aplicabilição do princípio geral do artigo 498 do CC?
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