Das Deliberações da Comissão Nacional de Eleições e do Conselho Constitucional Moçambicano
Conforme prometido, segue uma pequena reflerxão acerca das últimas deliberações do Conselho Constitucional e da Comissão Nacional de Eleições, com referência ao processo eleitoral moçambicano.
i) Exclusão de candidatos às presidenciaisO CC excluiu cerca de cinco candidatos às eleições presidenciais (entre os quais o meu amigo pessoal Yacoob Sibindy) alegadamente porque dos ficheiros dos seus proponentes, que devem ser pelo menos dez mil, boa parte das assinaturas eram inválidas, mostrando mesmo indícios de falsificação, o que, para a CNE consubstancia irregularidades insanáveis, determinando, por isso, a rejeição in limine, dos candidatos.
Note-se, entretanto que a Lei Eleitoral, no seu artigo 135 estabelece que uma vez notadas irregularidades, como foi o caso, o Presidente do CC manda notificar imediatamente o mandatário do candidato para as suprir no prazo de cinco dias. Recorde-se que as irregularidades foram notadas em todos os candidatos presidenciais, porquanto, as suspeitas sobre falsificação de assinaturas foram identificadas até nos três candidatos que a final foram aprovados, designadamente DHL, DS e AG. Recorde-se, igualmente que os candidatos cujas assinaturas não chegavam a dez mil predispuseram-se a sanar essa irregularidade, oferecendo outras listas (por exemplo, yacoob Sibindy forneceu mais de oito mil assinaturas válidas para suprir as rejeitadas). Entretanto, o CC não aceitou qualquer retrocesso no processo, tendo avançado para a exclusão pura e simples dos candidatos, sem nenhuma notificação para suprimento.
Note-se, igualmente, que a Lei eleitoral estabelece que um candidato só pode ser rejeitado liminarmente (vide artigo 136) nos termos do artigo 127, a saber: a) quando não goze de capacidade eleitoral activa; b) quando tenha sido condenado a pena de prisão maior por crime doloso; c) quando tenha sido condenado por furto e outros crimes dolosos ou d) quando não resida em Moçambique há pelo menos doze meses.
Não foi aqui o caso dos nossos candidatos.
Isto significa dizer, por outras palavras, que neste processo não se verificaram os requisitos legais para a rejeição de candidatos (pelo menos liminarmente). Verificaram-se isso sim, irregularidades processuais, sanáveis e que deviam ter determinado a notificação dos candidatos para aquele efeito (sanação).
Entretanto, o caminho seguido foi outro.
E as deliberações do CC são irrecorríveis…!
ii) Exclusão de listas de candidaturas para as legislativas
Aqui tivemos a CNE a excluir alguns partidos políticos de se candidatarem às legislativas, alegadamente porque alguns dos candidatos constantes nas listas eram inelegíveis.
Como ponto de partida, causa muita estranheza o facto de os partidos terem sido excluídos e a CNE não ter produzido nenhuma deliberação escrita, fundamentando devidamente (conforme preceituado pelo Decreto 30/2001 que aprova as normas de funcionamento da Administração publica) aquela posição.
Foi a falta de uma deliberação escrita e fundamentada que levou a que o nosso amigo Chipanga se desdobrasse em pseudo-explicações em todos os canais televisivos, virando triste estrela para explicar o inexplicável.
Quem não se lembra das palavras do mandatário do MDM à STV afirmando que já estamos há dias pedindo à CNE que nos faculte a deliberação escrita afim de nos podermos posicionar face à mesma?
Indo ao fundo da questão.
Segundo o nosso respeitado amigo Chipanga, cujas características já foram sabiamente apresentadas pelo nosso ilustre Nhama, a CNE excluiu do processo eleitoral algumas listas (de partidos) porque as mesmas continham nomes de candidatos inelegíveis, o que, no seu entender, iria originar que a Assembleia da República, ficasse com Deputados em falta, caso aqueles partidos concorressem e ganhassem.
Aqui acontece, mais uma vez, que foi desde logo preterida uma formalidade legal imperativa. Com efeito, o artigo 174 da lei Eleitoral, dispondo expressamente sobre o modo de eleição de candidatos à assembleia da República, estabelece expressamente que verificando-se irregularidades processuais, o presidente da CNE manda notificar imediatamente o mandatário da candidatura em causa para suprir, no prazo de cinco dias.
Estabelece ainda aquele artigo que o não suprimento da irregularidade implica a nulidade da candidatura.
Portanto, só depois de notificado o mandatário para suprimento, e na falta deste, é que se anula uma candidatura.
Sucede, entretanto que, no nosso caso, a CNE simplesmente anulou as listas, sem notificação nenhuma.
Outro facto que não pode deixar de ser notado por nós juristas é o facto de a CNE estar a fazer uma confusão de conceitos, nas suas «explicações».
Na verdade, a CNE excluiu listas de candidaturas (p. exemplo PIMO, etc) e não candidatos.
Sucede, porém, que a lei eleitoral não prevê, no seu articulado, a possibilidade de exclusão total de uma lista de candidatura e sim a exclusão de candidaturas (isto é, dentro da lista do PIMO, po exemplo, pode-se excluir um candidato a Deputado, se este apresentar irregularidades no seu processo. Não é lícito que se possa excluir uma lista inteira só porque um dos seus candidatos é irregular).
Aliás, o artigo 174 da lei eleitoral impõe expressamente que uma vez anulada uma candidatura pelo não suprimento de irregularidades, o lugar desse candidato deverá ser ocupado pelo candidato a deputado, imediatamente a seguir, na mesma lista.
Portanto, é ilegal a rejeição global de listas com fundamento em que alguns dos seus candidatos são inelegíveis já que a lei esclarece que se um dos candidatos a Assembleia de república for inelegível, o presidente da CNE devia simplesmente mandar notificar o mandatário da lista para substituir o candidato em causa.
É completamente infundada a alegação de que a Assembleia da República ficaria com deputados a menos, porque a própria lei já prevê mecanismos de substituição de candidatos inelegíveis.
Tanto é que nos termos do artigo 182 da lei eleitoral se ocorrer, durante o mandato, uma situação de um deputado morrer ou ficar impedido, a lei até permite que se vá às listas e se pegue num candidato que não foi eleito, para vir substituir o de cujus ou o impedido.
iii) SorteioQuanto ao sorteio, a CNE sorteou separadamente dois grupos de listas: primeiro a Frelimo e a Renamo e depois os demais partidos, o que determinou que a Frelimo e a Renamo ocupassem os dois primeiros lugares no Boletim de Voto.
Segundo o nosso amigo Chipanga, isto justificou-se pelo facto de a Lei preceituar que os candidatos que concorrem em todos os círculos devem ser sorteados à parte!!!
Mais um inverdade do nosso caro amigo que se tornou expert em desinformações.
A lei eleitoral preceitua apenas no seu artigo 179 que nos três dias posteriores à publicação das listas definitivas, a Comissão Nacional de Eleições procede, na presença dos candidatos ou mandatários que compareçam, ao sorteio das listas apresentadas, para fixação da sua ordem no Boletim de Voto, lavrando-se o auto de sorteio.
A diferenciação a que se refere o ilustre Chipanga não se encontra em nenhum artigo da Lei Eleitoral, sendo mais uma tentativa de desinformação!
Na verdade nem podia a lei prever tal procedimento, isto por uma razão muito simples: a Lei não prevê a rejeição de listas em alguns círculos eleitorais (mecanismo inventado pela CNE) e não prevendo tal rejeição, a lei não podia prever mecanismos diferenciados de sorteio entre os completamente admitidos e os parcialmente rejeitados.
É facto.
Caros Colegas, estas são as conclusões a que eu cheguei, no âmbito das pequenas pesquisas que sou obrigado a fazer, em virtude de toda a turbulência jurídica gerada à volta deste assunto.
Em todo o caso, espero serenamente pela sábia deliberação do CC que, se for diversa das minhas conclusões, terá, certamente, fundamento numa mais conscienciosa leitura da lei e dos factos, conforme é prática dos nossos mais velhos no Direito.
Cumprimentos a todos e boa semana de trabalho.
Sempre vosso
21/09/2009
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